Sicília: “Terra chi si cunfunni tra celu e mari”

Foto de © Edison Pratini. Marina no porto de Reggio Calábria.

A poesia de Giuseppe Lodato “Terra que se confunde entre o céu e o mar” descreve, em poucas palavras, uma terra feita de contrastes, famosa pelas suas belas praias, pelas erupções do majestoso vulcão Etna e pela máfia mais antiga da Itália, livremente referida por todos os italianos. Sicília é uma gama de paisagens e atrações! Desde sua incrível gastronomia até seus sítios históricos e praias de águas transparentes. A Sicília é riquíssima em história e belezas naturais. Por sua posição privilegiada, a região serviu como porta de entrada para diversos povos. Vários deles que passaram por ali, deixaram suas heranças culturais de valor inestimável.

Planejamos 40 dias para visitar a ilha e selecionamos nossa “casa” de acordo com os lugares que queríamos visitar. Sempre selecionamos uma cidade central para podermos visitar os pontos turísticos da região sem precisar trocar de hotel/apto o tempo todo. Desta forma, também conseguimos um bom desconto nas hospedagens. Permanecer por um tempo longo num determinado lugar nos aproxima mais dos costumes e culturas locais. Justamente por isso decidimos ter esta vida nômade, para permitir um contato íntimo com cada lugar que passamos. 

Pensando na geografia da ilha e nos lugares que gostaríamos de visitar, selecionamos 4 cidades para “morar”: Caltagirone, Agrigento, Taormina (fizemos duas paradas) e Palermo. Desta forma, conseguimos circular entre os pontos de interesse com mais tranquilidade. 

Mapa do nosso percurso na Sicília.
 

Após conhecer Reggio Calábria e seus arredores no continente, atravessamos o Estreito de Messina. Não tínhamos onde dormir nesse dia, porque houve um cancelamento indevido e inesperado de uma reserva que fizemos no site do Airbnb para Messina. Foi um sufoco. Depois que a balsa atracou no porto de Messina, começamos a perambular pela cidade a fim de encontrar um lugar de hospedagem, mas era época do Ferragosto, o que significa a celebração de período de férias italianas. Ferragosto é um feriado celebrado anualmente em 15 de agosto em toda Itália. Tem origem na Feriae Augusti, festa do imperador Augusto, que decidiu que essa data seria um dia de descanso após semanas de muito trabalho no setor agrícola. Por conta do cancelamento inesperado no dia de um feriado tão importante na Itália, passamos o dia procurando hospedagem, mas estava tudo caríssimo, nada estava a menos de € 280/dia. Acabamos encontrando uma hospedagem em Acireale – a 85km de Messina -, cidade próxima de Taormina e do vulcão Etna. Acireale, curiosamente, estava com as ruas e calçadas cobertas com uma areia grossa e preta. Depois soubemos que era areia proveniente das constantes erupções do Etna. A acomodação não era das mais confortáveis e decidimos continuar procurando. Depois do sufoco, conseguimos uma hospedagem mais confortável em Caltagirone, cidade conhecida pela sua tradicional produção de cerâmica. Ficamos encantados! Situada numa colina. Pela estrada se avista as cores quentes de suas casas que parecem geradas espontaneamente da terra, surgindo a partir de uma erupção vulcânica.

O apartamento que nos hospedamos, localizado bem no centro histórico da cidade (Link Airbnb do apartamento), tinha uma varanda que nos presenteava diariamente com paisagens do pôr do sol refletido na torre de sino da igreja principal.

Foto de ©Edison Pratini. Vista da nossa varanda em Caltagirone.

Passear de carro pelas ruas de Caltagirone foi uma experiência e tanto. Como na maioria do pequenos borgos italianos, se algum carro grande se aventurar e adentrar pelas ruelas de um centro histórico, correrá um sério risco de ficar entalado entre as paredes. De verdade! O GPS já nos colocou em cada enrascada! Sorte que o Edison é um motorista e tanto! Muitas vezes ele conseguiu sair destas enrascadas saindo de ré ou "encaixando" um Mitsubishi Outlander no meios das paredes das casas que estreitavam a passagem. Outra particularidade é passear a pé pela maioria das cidades da Sicília que significa subir e descer muitas escadas!

Foto de ©Edison Pratini. Nossa rua em Caltagirone.

Caltagirone estava em festa! Chegamos exatamente no dia de um evento importante. A proprietária do apartamento nos informou que era dia de celebração da padroeira da cidade: Nossa Senhora das Pontes. Nos orientou como chegar até o local do evento e era quase na esquina de onde estávamos. Bastava apenas atravessar duas das ruelas para chegarmos até a escadaria Nossa Senhora dei Monte. Francamente, não esperávamos muito, estávamos cansados, mas fomos mesmo assim. Foi uma sábia decisão! Participamos da cerimônia como se fossemos locais, ficamos em um ponto acima do meio da escadaria onde as velas já estavam distribuídas, pelos seus degraus, e que seriam acesas pelos moradores e participantes da festa. Ficamos observando o movimento. Após um tempo, percebemos que estavam acendendo as velas. Pedimos fósforos e começamos a fazer o mesmo. Era fim da tarde, ao pôr do sol. Quando escureceu, todas as velas já estavam acessas e, para nossa surpresa, quando descemos até praça para ver a escadaria de baixo, descobrimos que as velas faziam uma linda e colorida imagem de Nossa Senhora das Pontes. 

Vejam os vídeos com as imagens desta festa. 👇

Foram 20 dias curtindo as festas da cidade de Caltagirone. Neste mesmo período, visitamos Catânia, Taormina e fomos nos aventurar nas encostas e crateras do Vulcão Etna.  Aproveitamos para conhecer algumas praias de Acireale. Afinal, estávamos na Sicília! Apesar do lindo cenário do mar azul e calmo, de banhistas mergulhando como se estivessem iniciando um nado livre numa piscina, outros se bronzeando nas bases das enormes pedras, decidimos não fazer o mesmo. O acesso de pedras não era dos mais estimulantes.

Praia de Acireale. Imagem retirada da internet para ilustrar nossa experiência.

Praia de Acireale. Imagem retirada da internet para ilustrar nossa experiência.

Alguns dias depois, fomos para Catânia, uma cidade portuária na costa leste da Sicília que fica no sopé do Monte Etna. É uma cidade jovem e alegre cuja história é contata por meio de seu lindo centro histórico. Na praça central, a Piazza del Duomo, encontram-se a famosa fonte do elefante e a Catedral de Catânia que, na verdade, se chama Brasília Catedral de Santa Ágata, santa que nasceu e morreu em Catânia. É uma cidade cativante pela beleza da arquitetura barroca.

Foto de ©Marina Ribeiro. Piazza del Duomo e a estátua do elefante, Catânia.

Vídeo de Catânia 👇

Agora chegou a vez de falarmos de Taormina. Ah, Taormina! A Pérola do Mar Jônico, como é chamada a cidade, é cheia de cantinhos especiais, terraços panorâmicos com vistas incríveis para a costa leste da Sicília. Gostamos tanto que decidimos voltar. Uma pequena cidade, no topo de uma montanha, cercada de muralhas e estradas tortuosas. Parece trivial, né? Afinal a maioria dos borgos italianos são assim...MAS, não é trivial não. Suas estradas são tão paradisíacas como as da Costa Amalfitana. É uma cidade medieval murada e muito bem preservada, pronta para ser explorada a pé e só lembrar do automóvel no dia de ir embora. Seu charme e beleza não são nada triviais. Deixamos o carro num estacionamento privado localizado fora da cidade murada e só lembramos dele na hora de partirmos.

Foto © Edison Pratini. Vista da janela do nosso quarto: a Piazza IX Aprile.

Passear pela rua Corso Umberto é uma diversão! Oferece várias lojas e restaurantes para um bom passeio em qualquer hora do dia. Por esta rua voce encontra importantes pontos turísticos como duas praças principais da cidade: a Piazza Duomo e a Piazza IX Aprile. Esta última é a maior e principal da cidade. É considerada como a "sala de estar" por conta de seu belo e amplo terraço com bancos que oferecem conforto para apreciar o mar e seu horizonte, observar as pessoas passeando pela rua Corso Umberto ou assistindo alguma festa de casamento, batizado ou saída das pessoas da missa na igreja San Giuseppe.  

 

Foto © Edison Pratini. Via Corso Humberto.

Foto © Edison Pratini. Via Corso Humberto.

Vídeos da Piazza IX Aprile em plena festa de casamento 👇

Já na Piazza Duomo, está a catedral, uma pequena igreja dedicada a São Nicolau, construída no século XIII. Aliás, parece que a temporada de casamentos na Sicília é no verão, porque também presenciamos cerimônias neste lugar. Todas muito lindas e animadas, sempre acompanhadas de carros decorados das mais variadas épocas e estilos como cinquecentos, vespas, fuscas, carros de colecionadores, enfim a criatividade italiana é impressionante!

Foto © Marina Ribeiro. Piazza Duomo.

Foto © Edison Pratini. Piazza Duomo.

Fora a beleza das casas, igrejas e praças tão bem preservadas, os lugares que mais nos chamaram atenção foram: 

1. Chiesa Madonna della Rocca, construída numa rocha. Existe uma lenda sobre um menino assustado que se escondeu dentro desta gruta fugindo de uma tempestade. Ele avistou uma mulher de azul segurando um bebê que tentou confortá-lo. Mas ele fugiu assustado e falou o ocorrido para o povoado. Após este fato, encontram nesta gruta um desenho de uma mulher com um bebê. Por este motivo, decidiram construir uma igreja no local. A vista é linda e a pequena igreja é bela na sua simplicidade. Nós fomos de carro, mas tem uma escada que parte do centro histórico em direção à igreja. A subida leva 60 minutos, mais ou menos. 

Imagem retirada da internet. Chiesa Madonna della Rocca.

Imagem retirada da internet. Chiesa Madonna della Rocca.

Foto © Edison Pratini. Interior da Igreja Madonna della Rocca.

Vídeo a partir do terraço da Igreja Madonna della Rocca👇

2. A praia que fica na passagem para a Isola Bela, localizada dentro de uma pequena baía do mar Jônico. Existe um caminho estreito que liga a ilha à praia. Muito interessante. Vale a pena conferir! Fica na parte baixa a cidade. Basta pegar um bonde que liga a parte alta com a baixa e caminhar uns 15 minutinhos para chegar até lá.

Foto © Edison Pratini. Passagem para a Isola Bela, Taormina.

Depois de Taormina, fomos para uma exploração nas encostas e crateras do vulcão Etna. Uma experiência e tanto. Parecia até uma expedição lunar, areia e pedras pretas com várias crateras em volta! É o vulcão mais alto da Europa, com 3,357 metros de altitude, podendo aumentar devido às frequentes erupções. Não é uma caminhada fácil. Além da questão da altitude, muitas vezes o pé afunda na areia ou escorrega nos pedregulhos. Deixamos o carro no estacionamento do Rifugio Sapienza que está a 1900 metros de altitude. De lá, pegamos um teleférico que nos levou até a primeira base onde tem bares e lojinhas com lembrancinhas locais. Para chegar mais perto da cratera ativa, pegamos um ônibus 4x4 que nos deixou ao pé das maiores crateras. A partir desta etapa, pode-se chegar até a cratera principal que fica a cratera que está em constante atividade. Ficamos um pouco frustrados quando vimos na TV que o vulcão estava tendo uma erupção dois dias depois da nossa visita. Gostamos de adrenalina e seria o máximo assistir de perto este espetáculo. 

Foto © Edison Pratini. Cratera do vulcão Etna.

Foto © Edison Pratini. Marina descendo da cratera do vulcão Etna.

Foto © Edison Pratini. Marina descendo da cratera do vulcão Etna.

Vídeo da nossa aventura no vulcão Etna 👇

A próxima parada foi Agrigento, a terra do vale dos Templos. Outra hospedagem com uma vista sensacional! O apartamento não era dos melhores, necessitava de manutenção. Sem falar dos vizinhos que eram um pouco alterados e começavam a falar e a gritar às 06 horas da manhã e continuavam até o início da madrugada. Nem colocaremos o link, porque não recomendamos. Em pleno verão e sem ar-condicionado, não tinha como fechar as janelas. Enfim, faz parte da nossa aventura. Volta e meia passamos por alguns apertos, mas o tempo é o melhor remédio. Tudo passa...tudo passará (como cantava Agnaldo Timóteo). 

Foto © Edison Pratini.
Vale dos Templos e Templo de Concordia vistos a partir da janela do nosso apartamento em Agrigento

Agrigento é bem conhecido por conta do Vale dos Templos, antiga cidade de Akragas, é um sítio arqueológico muito visitado na Sicília. Ao longo de sua história, a cidade de Akragas foi uma importante cidade-estado com mais de 200.000 habitantes. Durante o período romano, a cidade foi renomeada como Agrigentum. É um lugar de grande importância histórica e cultural.

Foto © Edison Pratini. Templo da Concordia no Vale dos Templos, Agrigento.

Foto © Edison Pratini. Vale dos Templos, Agrigento.

As principais atrações do centro histórico são as igrejas, os mosteiros, uma escadaria pintada por artistas locais que se chama Via Dell’Arte. As principais igrejas da cidade são a Basílica da Imaculada, a Catedral de São Gerlando, a Igreja de Santa Maria dei Greci e o Mosteiro de Santo Spirito. 

Foto © Edison Pratini. Catedral San Gerardo. Agrigento, Sicilia.

Foto © Marina Ribeiro. Altar da Catedral de Agrigento.

Foto © Edison Pratini.  Rua da Chiesa del Purgatorio, Agrigento.

O centro histórico de Agrigento se desenvolve a partir de uma rua principal, a Via Atenea, e ao redor dela surge uma série de ruas labirínticas, um sobe e desce de escadas e ladeiras, como a maioria das cidades na região montanhosa da Sicília.

Foto © Edison Pratini. Escadaria Via dell'Arte

Para nós o ponto alto em Agrigento não foi o Vale dos Templos e sim a praia da Scala dei Turchi. Uma esplêndida joia branca deslumbrante que emoldura o azul claro do mar. Uma incrível falésia branca em formato de escadas. É um lugar fascinante, onde séculos de chuva e vento esculpiram uma escadaria natural e cuja cor branca se torna mais deslumbrante com a luz do sol. Vídeo 👇

A partir de Agrigento atravessamos a Sicília para chegarmos em Palermo. Que alegria é esta cidade! Ficamos hospedados em dois lugares bem, mas bem no centro histórico mesmo! Onde acontecem as festas de verão. Foi o máximo. Dois apartamentos bem charmosos e confortáveis, sendo que o primeiro era bem típico do sul da Itália que transformam a parte térrea de pequenos prédios que um dia foram garagem ou pequenas lojas em apartamentos (Link Luna Maison Palermo) e o segundo foi um apartamento maior e o elevador abria na porta da sala. Isso foi o máximo! Brincamos de elevador como crianças! Infelizmente não encontro o link deste último apartamento que era na mesma rua. Provavelmente não estará mais disponível para aluguel por temporada. Temos registrado a nossa brincadeira no elevador! 😂👇

Foi uma semana de pura festa! Banda de jazz pelas ruas, shows de diversos tipos nas praças, blues nos bares, feiras oferecendo guloseimas típicas sicilianas e gente jovem bronzeada por todos os lados. Nos divertimos demais! Aliás, foi o lugar onde mais nos divertimos! 

Vídeo 1. Bruxinho se divertindo nas feiras de Palermo. 👇

Video 2 . Jazz ao vivo e gratuíto nas ruas de Palermo.👇

Nos sentimos em casa a ponto de pensarmos em “morarmos” por lá por mais tempo. Infelizmente, tínhamos que voltar para Colle de Val d'Elsa, Toscana, para uma consulta médica. 

Foto © Edison Pratini. Palermo Jazz Club, via Quintino Sella, Palermo .

Palermo é a capital da Sicília. Os pontos turísticos são muito bonitos, como a Catedral de Palermo, por exemplo, do século XII e o Teatro Massimo, com seu estilo neoclássico, conhecido pelos espetáculos de ópera. Claro que não podíamos deixar de assistir no teatro e compramos duas entradas para a Ópera Carmem, de Bizet. Mas foi só para passar calor e raiva. Nem assistimos a Ópera até o final.  Tinha um cenário pobre remetendo o clássico para o século XX. Transformaram um gênero musical erudito em moderno. O cenário era muito simplório, um automóvel, com os cantores em sua volta, basicamente. O teatro sim, é um charme, mas com problemas de manutenção e um calor infernal. Uma pena.

Foto © Edison Pratini. Teatro Massimo, Palermo, Sicília.

Aproveitamos para visitar Cefalu, uma cidade bem pequena com um belo centro histórico antigo e ruas românticas cheias de personalidade. É conhecida por suas vistas incríveis do cais 'Molo di Cefalu', que dá para as casas autênticas da cidade e a pequena praia central. 

Foto © Edison Pratini. Molo di Cefalu, Sicilia.

A Catedral da cidade fica no ponto mais alto, ladeada por pequenas osterias, terraços e deliciosas sorveterias. 

Foto © Edison Pratini.  Catedral de Cefalu, Sicília.

Foto © Marina Ribeiro. Altar da Catedral de Cefalu, Sicília.

Foto © Edison Pratini. 
Praça na frente da escadaria da Catedral de Cefalu, Sicilia.

Foi uma viagem de um dia, um bate e volta a partir de Palermo. Já estávamos em meados de setembro e era tempo de planejarmos o nosso trajeto de volta para Toscana.

Foto © Edison Pratini. Bruxinha passeando pelas ruelas de Cefalu, Sicília.

Antes de deixar a Sicília, decidimos passar mais dois dias em Taormina, e em seguida pegar o Ferry de Messina. 

Arriverdeci, Sicilia! 

A viagem pela Sicília foi em Agosto/Setembro 2021. Qual foi o próximo trajeto planejado? Ah, esta parte será contada na próxima postagem. Afinal, este blog é escrito por temporadas. Passamos um tempo sem divulgar nossos registros que aqui retornam. Aguardem os próximos capítulos!

Coisa linda e boa vem por aí. Garantido!